O impacto da lei no mercado de trabalho cinematográfico

Set de filmagens do filme “O Fim do Cinema”, da 4UFilms Foto: Vitor Miguel

Entender as especificadades desta lei é importante para compreender as formas que ela poder influenciar o cinema brasileiro, no entanto, para poder imaginar de forma mais geral a disparidade que o mercado nacional possui com relação aos grandes polos de produção como Hollywood, considere a seguinte anedota: Certa vez, um cineasta brasileiro disse, com meio sorriso e muita sinceridade: “Fazer filme no Brasil é como tentar gravar um épico em Hollywood com o orçamento de um churrasco de domingo.” A frase até arrancou risos, mas também revelou uma verdade profunda: apesar do talento, da criatividade e de sua importância cultural e econômica, o cinema brasileiro vive uma constante batalha entre o seu potencial e a realidade que ele enfrenta.

Junto com isso, é preciso ter em mente que o setor audiovisual possui uma grande importância socioeconômica para o Brasil. Segundo dados da SPCine de 2022, ele gera anualmente mais de 200 mil empregos diretos e cerca de 300 mil indiretos, movimentando cerca de R$3 bilhões em salários fixos e outros R$4 bilhões em serviços prestados à indústria. A implementação da chamada "Lei de Cotas de Tela", que determina a obrigatoriedade de exibição de filmes brasileiros nos cinemas até 2033, contribuiu para o aumento da demanda por produções nacionais. Com isso, há um impacto direto na geração de empregos no setor, beneficiando, em teoria, os diversos profissionais que compõem a cadeia produtiva do cinema nacional.

Contudo, isso não significa que o setor vive o seu auge em 2025. Pelo contrário: quando comparamos os dados de empregabilidade, observa-se uma queda significativa. Em 2010, o Brasil contabilizava 106.022 vínculos formais no setor audiovisual. Em 2019, esse número caiu para 88.053, uma redução de quase 18 mil postos de trabalho, segundo o estudo “Emprego no setor audiovisual”, elaborado a partir da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) do Ministério do Trabalho.

Diante desse cenário de retração no número de empregos formais, a valorização do cinema independente e da diversidade de narrativas que esta medida influencia, surge como uma estratégia crucial para revitalizar o setor. É o que defende Leonardo Edde, presidente da RioFilme, ao destacar a importância de abrir espaço para diferentes vozes e histórias no mercado cinematográfico brasileiro, fortalecendo a indústria não apenas economicamente, mas também cultural e socialmente.

Além disso, ao falar sobre como a Lei de Cotas de Tela pode influenciar a estabilidade e potencial crescimento do mercado de trabalho, Tânia Pinta, Gerente de Negócios da Vitrine Filmes, ressalta como esta relação depende que os efeitos esperados com a promulgação desta medida sejam alcançandos. Entre estes, ela cita a rotatividade de títulos:

Outro aspecto revelador dessa realidade é a desigualdade regional no desenvolvimento do setor. Enquanto algumas localidades demonstraram crescimento expressivo, outras viram sua participação diminuir. No caso do Rio de Janeiro, a movimentação econômica no setor audiovisual cresceu 56,2% entre 2020 e 2023. De acordo com o subsecretário de Desenvolvimento Econômico e Inovação do município, Marcel Balassiano, essa expansão transformou o setor na décima maior força econômica da cidade, gerando 20 mil empregos formais e movimentando cerca de R$4 bilhões apenas na capital fluminense.

Em contraste, o estado do Ceará registrou queda. Entre 2010 e 2022, o número de empregos formais no setor audiovisual cearense caiu 19,85%, passando de 1.466 vínculos para apenas 1.175, conforme dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) do Ministério do Trabalho e Emprego.


Considerando tudo isso, é possível afirmar que, embora a Lei de Cotas de Tela represente um avanço importante na valorização e promoção do cinema nacional, seus efeitos sobre o mercado de trabalho ainda revelam um impacto desigual e insuficiente no setor. A obrigatoriedade de exibição impulsiona a produção de conteúdo, mas, sozinha, não garante a geração sustentada de empregos nem a distribuição equilibrada de oportunidades pelo país. Para que o potencial da lei se concretize, é fundamental que ela seja acompanhada de políticas públicas mais amplas, voltadas à formação profissional, incentivo regionalizado e o apoio contínuo à indústria.

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